A quem possa interessar, viver em Lima é uma aventura diária constante. É impressionante como naquela cidade a qualquer instante podem dar-se momentos caricatos e inesperados – subir para uma combi (1) de manhã e ser a trigésima pessoa num veículo com capacidade para 15 ( já apertados) e ser “descascado” pelo cobrador com um “apeguem-se mais que aí atrás ainda há espaço!!!” é o dia-a-dia de qualquer viagem de transporte colectivo; não é inédito, ainda na micro (2) em questão ver o filho do condutor a dormir ferrado, estendido no lugar da frente com a cabeça nas mudanças no meio de um trânsito citadino de tal forma intenso que uma distância de 4 km pode demorar mais de uma hora a ser percorrida; passar no Parque Kennedy a meio de um sábado e encontrar grupos de velhinhos a dançar salsa como se não houvesse ninguém a olhar e perceber que no Peru o conceito de “estar na bicha” simplesmente não existe, que “hora peruana” quer dizer que as coisas começam 1h30 depois do estipulado no convite e que não vale a pena queixarmo-nos de que o céu está cinzento, porque o Sol pura e simplesmente não aparece de Novembro a Janeiro...
Sem ser uma cidade bonita à primeira vista, Lima é uma cidade riquíssima e vivida. Erigida sobre uma falésia em cima do Oceano Pacífico, uma cultura gastronómica entre as melhores do mundo, um povo aberto a visitantes e, actualmente, possuidora de uma das economias mais atractivas do mundo, Lima é um lugar em que facilmente uma pessoa se sente em casa.
Os Limenhos são surpreendentemente parecidos connosco, os mesmos valores mas ainda mais abertos e calorosos. Têm gosto em abrir as suas casas para uma parrillada (2) com amigos, família e amigos de amigos, gostam de se divertir e de dançar ritmos latinos (digam adeus às boîtes onde se ouve David Guetta e o puntz puntz a que estamos habituados).
Sendo uma cidade jovem , usam muito a jerga (3) local e, como tal, ter algum conhecimento prévio de espanhol (latino ou de Espanha) pode-se tornar numa grande vantagem (recomendo o site www.tubabel.com, onde podem encontrar o calão mais comum do Peru, e outros países da América Latina, para uma aculturação mais rápida). Os Limenhos também sabem que a melhor bebida para acompanhar um prato peruano é uma Inca Kola (4), que ninguém sobe a um táxi sem antes negociar o preço que já foi refutado pelo menos em 30% do que o taxista tentou vender (é importante ir fazendo um mapa mental do quanto custam os vários percursos – que variam consoante trânsito, noite, dia, e humor do motorista).
A Embaixada de Portugal, a entidade receptora, permite acima de tudo, montar uma rede de contactos interessantes tanto portugueses como peruanos.
É importante, ainda, referir o crescente interesse económico comum, de ambos os lados, e que existem bastantes expatriados no Peru e um número significativo de parcerias entre empresários dos dois países.
É de aproveita, portanto, o potencial desta capital da América Latina, a única costeira, e as oportunidades que surgem através do estágio. Diferenças e problemas de aculturação... mais do que a quantidade astronómica de picante que usam em todos os pratos, a presença central da cebola roxa crua e os infindáveis usos para o limão (as nossas limas), se se souber algo do idioma, se se mantiver uma postura street wise (porque não deixa de ser a América do Sul com as características disparidades entre níveis de vida), na minha opinião pessoal, parece-me que Lima reúne todas as condições para uma experiência inesquecível.
(1) autocarro
(2) churrascada
(3) calão
(4) bebida nacional de cor amarela detida pela Coca-Cola