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Análise de uma fotografia…um instante de vida capturado para a eternidade

Raquel Sofia Ramos da Rocha | C21 | Rato, Ling, Lei &Cortés | Macau | RAEM-China

Já se passaram quase 5 meses desde que, vinda do aeroporto de Hong Kong, via ferry cheguei a Macau. Uma das primeiras coisas que senti, foi a mudança do ar, o cheiro, ainda antes de me aperceber de quaisquer dificuldades de comunicação, o que viria a sentir nesse mesmo dia.

Isto definitivamente não era Portugal. O próprio céu era diferente, uma mistura de cinzento opaco com laivos de luz. Tão diferente da luz de Portugal!

Esta foi uma das primeiras fotos que tirei, numa tarde de domingo em que, pela primeira vez, me dirigi, com aqueles que viriam a ser os meus colegas de casa, às Ruínas de S. Paulo (local turístico por excelência, que atrai milhares de visitantes por ser um dos marcos históricos da presença portuguesa em Macau).

A primeira vez em que, depois de toda a correria de procurar casa nos parcos espaços de tempo vagos entre o horário de estágio, e da tentativa atabalhoada de nos conseguirmos orientar, tanto geográfica, como materialmente (porque, sim, a verdade é que precisávamos de tudo um pouco com uma mudança de apenas 30kgs para o outro lado do planeta!) e, ainda a recuperar do longo voo, fomos mergulhados, submergidos nesta realidade.

E daí a escolha desta fotografia, deste mar infindável de gente, andando pela calçada portuguesa. Isso representa Macau.

Mas não só isso. A essa sensação claustrofóbica, opressiva e comercial, a essa intensidade e velocidade de vida e de eventos, de pessoas, a essa mancha que se arrasta pelo canto do olho, qual passagem de carros numa ponte, vem também juntar-se um outro lado, oculto àqueles que não escolhem conscientemente olhar, parar e sentir. Reflexos de uma beleza, de uma paz, de recantos perdidos, pedindo para serem encontrados. Está recheado de pérolas, este rio e esta terra (Macau localiza-se no delta do rio das pérolas).

E vão surgindo inesperadamente estes momentos, cativando, prendendo, como um por de sol passado no Farol da Guia, a ver a noite cobrir a cidade em luzes ou um mergulho noturno na piscina do Estoril, sentindo o silêncio que chega de mansinho e preenche a alma, ou um almoço no parque, sentindo o sol no rosto e a companhia de amigos que Macau trouxe e acalentam o dia, já de si quente, ou um espetáculo de Jazz no LMA, cuja envolvência se perderia em qualquer tentativa de descrição, ou uma exposição de arte, em que a magnitude te menoriza, ou passear pela praia em Hac Sa...sentindo a areia preta nos pés e o sal no ar e o coração livre.

Passear sem rumo em Macau é uma experiência multissensorial, táctil, olfativa, crua, real… Entre os casinos, com a sua opulência, o luxo, o frenesim do jogo e do dinheiro, que não para de circular, o perfume que circula no ar e que vincula cada lugar a um cheiro, envolvendo quem por lá passa numa névoa de indiferença e desapego, e o marcado contraste de percorrer as ruas tradicionais, estreitas, malcheirosas, recheadas de lojas, cada uma com oferendas de frutas e incenso à porta, com placares luminosos e publicidades, e baratas, e ratos, e pessoas. Sempre mais pessoas...Um choque de realidade.

É necessário um especial tipo de abandono para se sentir verdadeiramente Macau, uma entrega, uma procura, porque é nessas mesmas ruas que também se encontram pequenos templos que nos remetem para um outro tempo, e jardins, becos, e arte e vida. É na Casa do Mandarim e nas Casas-Museu da Taipa que encontramos o retrato físico da Macau, Chinesa e Portuguesa, de um outro tempo, perdido, mas não inteiramente.

E calcorreando os trilhos de Coloane, sob o olhar atento da Deusa A-Má, ouvimos pássaros e sentimos o ar límpido da floresta encher os nossos pulmões, ou o cheiro de terra húmida quando a chuva teimosamente cai, sem abrandar o calor que está sempre presente.

E depois esta fotografia. Porque Macau é também a impossibilidade de se estar sozinho num lugar público, é viver num prédio conjuntamente com centenas de pessoas, é esta partilha de espaço, ou da falta dele, é ler português, inglês e chinês nas montras. É um mar de caras diferentes que se tornam as nossas memórias de um lugar, é uma cultura e identidade singulares que abraçamos.

É assim a minha Macau: atrozmente sufocante, sublimemente bela. Rendo-me a ela.

Created By: Raquel Sofia Ramos da Rocha
Published: 10-11-2017 15:10

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