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Trabalhar Deutsche Welle em plena pandemia
Marta Cardoso | C24 | Deutsche Welle | Bona, Alemanha
DW

Trabalhar num grande meio de comunicação alemão já é, em si, um desafio. A Deutsche Welle (DW) tem cerca de 1 500 trabalhadores de mais de 60 nacionalidades, a produzirem conteúdos em 30 línguas. A multiculturalidade que se vive na delegação de Bona é óbvia e visível nos corredores das redações. Ir à cantina é um acontecimento! Entre africanos, australianos, russos, brasileiros, sírios e alemães… nunca se sabe que língua falar com quem está sentado ao nosso lado.

Só no meu departamento - português para África - trabalham mais pessoas do que em muitas redações portuguesas. E trata-se de uma redação pequena, dizem… Ainda assim, recursos humanos não faltam. Uma novidade para quem trabalha na área da comunicação há cinco anos e está habituada a fazer “omeletes sem ovos”.  

A organização alemã leva a que, em cada turno, todos tenham tarefas específicas. Basta olhar para o horário para perceber o que vou fazer e a quem tenho de reportar. Mas em tempos de coronavírus a empresa teve de se reorganizar. Na minha redação deixámos de produzir dois noticiários diários de rádio, passámos a produzir apenas um e apostámos ainda mais no conteúdo online. Deixei temporariamente os microfones - algo que nem aconteceu assim tantas vezes em apenas duas semanas de estágio presencial - e passei a escrever apenas para a página portuguesa da DW África.

Apesar de ser aborrecido escrever diariamente sobre a Covid-19, cedo percebi a importância do que estávamos a fazer. A DW é vista nos países africanos lusófonos como um órgão independente. E isso é fundamental para o combate às chamadas “fake news” sobre o novo coronavírus, algo que prolifera nos países africanos. Desde que o vírus era mais resistente à pele negra ou que o vento podia trazer o “bicho” do país vizinho, li de tudo!

Mas, se acreditava que ia passar meses apenas a escrever sobre a epidemia que tornou o ano 2020 numa história digna de filme de terror – e que mandou para casa metade da população mundial, enganei-me. A trama em África já é antiga. O coronavírus agravou a fome e as desigualdades sociais, mas não apagou os problemas crónicos existentes.

Em dois meses de “home office” escrevi artigos sobre o golpe de estado na Guiné Bissau, o caso “Luanda Leaks”, os ataques armados de grupos terroristas no norte de Moçambique, migrantes que forçaram fronteiras e outros sobre violações de direitos humanos.

Em termos internacionais, dei a notícia do adiamento dos Jogos Olímpicos de Tóquio, assinalei o primeiro Dia Mundial da Língua Portuguesa e os 75 anos do fim da II Guerra Mundial. Tudo isto enquanto o mundo inteiro enfrenta outra guerra, desta vez pandémica e contra um inimigo invisível.

Em termos pessoais, celebrei 30 anos numa “digital party” em plena pandemia, poucos dias após o fecho de fronteiras que obrigou grande parte dos meus novos amigos a regressarem ao país de origem por tempo indeterminado. Um mal necessário para o bem de todos, mas com um sabor amargo.

Com a reposição da segunda emissão diária de rádio, a meio de maio, tive de me reinventar e começar a fazer “reportagens” sonoras em casa. Foi um verdadeiro desafio ir atrás das notícias. Não só descobri-las, como encontrar as fontes certas, fazer entrevistas por WhatsApp e conseguir criar narrativas a partir dos vários ficheiros de áudio gravados no meu telemóvel que, entretanto, se transformou em microfone para locução. Uma missão possível mas morosa.

Neste formato de rádio em teletrabalho, pude contar os dias atípicos de um estudante universitário moçambicano e de outro cabo verdiano na Argélia, o terceiro país africano mais afetado pela Covid-19. E consegui ainda ter o ACNUR – Alto Comissariado da ONU para os Refugiados – a denunciar a deportação de 279 congoleses pelas autoridades angolanas na última quinzena de abril. Ora espreitem: https://p.dw.com/p/3caM4.

Trabalhar num grande órgão de comunicação alemão revelou-se muito diferente das minhas expetativas iniciais. Fui às instalações da DW duas vezes desde que entrou em serviços mínimos e senti-me num cenário pós-apocalíptico. Os corredores, outrora cheios de vida multicultural, estavam vazios.

Tenho a convicção que o teletrabalho veio para ficar, ainda que parcialmente. Mas fiquei ainda com mais vontade de contar as histórias das pessoas “no terreno”, pelos meus olhos e sensações e não apenas pelos testemunhos de outros. Mas estou certa de que, independentemente do meio e do formato, o importante é contar o que se passa no mundo. Porque informação é poder, mas manter a ignorância também.

Fotografia de Marta Cardoso

 
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Created By: Marta Alexandra Craveira Cardoso
Published: 02-07-2020 9:30

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