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“Esta pandemia vem realçar a necessidade de investir em I&D" refere o C6 Luís Apolónia em entrevista à C24 Filipa Fonseca

Filipa Fonseca | C24 | Kings College London | Londres, Reino Unido

Entrevista da C24 Filipa Fonseca ao C6 Luis Apolónia
 

Luís Apolónia, C6 doutorado em Virologia/ Terapia Genética pela University College London, em conjunto com alguns dos seus colegas do departamento de doenças infeciosas do King’s College London (KCL), em Londres, iniciaram estudos relacionados com a doença COVID-19. São várias as equipas de investigação que se uniram numa tentativa de acelerar o processo de desenvolvimento de terapias para combater esta doença que tantas mortes já provocou.

Durante algum tempo, este Contacto conversou com a C24 Filipa Fonseca sobre o seu trabalho

Em traços gerais, em que se baseia este novo projeto com o SARS-CoV-2, o vírus que causa a COVID-19?

Os sobreviventes de doenças infeciosas conseguem montar uma resposta imunológica contra o vírus que causou a doença. Muitas vezes, isso consegue-se com a produção de anticorpos, que são proteínas produzidas por células especializadas (linfócitos B) e que têm a capacidade de reconhecer o vírus ou células infetadas. Por vezes, estes anticorpos conseguem mesmo impedir que os vírus consigam infetar novas células, chamando-se assim anticorpos neutralizantes. Neste projeto, estudamos se pessoas convalescentes da COVID-19 produziram anticorpos específicos contra o novo SARS-CoV-2, como é que a concentração desses anticorpos varia ao longo do tempo e qual a capacidade desses anticorpos de neutralizar os vírus. Depois de identificados os melhores anticorpos, poderemos produzi-los em quantidades suficientes para que possam ser usados na terapêutica de pacientes com COVID-19.

Na sua opinião, quais são as vantagens do uso de anticorpos neutralizantes no combate ao vírus em relação a certos fármacos que estão a ser bastante falados, como a cloroquina ou o remdesivir?

Ambos os fármacos referidos foram desenvolvidos para combater outros agentes infecciosos: a cloroquina contra o parasita (plasmodium) que causa malária e o remdesivir, contra o vírus da hepatite C. Apesar de causarem alguns efeitos secundários, o seu valor terapêutico é tal que são utilizados no tratamento destas doenças. A grande vantagem de os utilizar no tratamento da COVID-19 é estarem já disponíveis e aprovados para serem usados em humanos. No entanto, no caso do remdesivir, o seu valor medicinal no tratamento desta doença ainda não foi totalmente comprovado. É de referir que a OMS parou recentemente um dos seus ensaios clínicos (que usava a cloroquina) por esta estar associada a uma maior taxa de mortalidade, num estudo recente.

Por outro lado, os anticorpos, para além de serem específicos contra o vírus que causa a COVID-19, em geral são bem tolerados pelo corpo, desde que não haja sobredosagem para obter um efeito terapêutico. No entanto, devemos também referir, que um subproduto do sangue – o plasma – que contem estes anticorpos (apesar de não estarem purificados) está a ser utlizado em ensaios clínicos em todo o mundo, inclusivamente em Portugal. É de salientar que existem muitos laboratórios em todo o mundo (alguns dos quais também no KCL e em colaboração connosco) que continuam a testar outros fármacos e a desenvolver novos, uma vez que ainda não existe vacina nem tratamentos para esta doença.

Embora sejam um grupo de investigação em doenças infeciosas, o vosso foco normalmente é outro vírus, o HIV. Quais foram as principais adaptações feitas nas condições de trabalho para a realização deste novo estudo com o SARS-Cov-2?

Nós estudamos o HIV (entre outros vírus, como o Influenza, Ébola, Norovirus, etc), mais concretamente. Como os vírus usam as células humanas para se multiplicarem, como as células se defendem dos vírus e como os vírus conseguem evitar esses mecanismos. Com este conhecimento, se conseguirmos desequilibrar a balança e dar vantagem às células humanas nesta batalha (através de fármacos, por exemplo), então a guerra nestas doenças poderá estar ganha. No entanto, também usamos, desenvolvemos e otimizamos HIV para manipular geneticamente células: modificamos o HIV, de modo a que consiga infetar células mas não se consiga propagar (chamados de vetores) e usamo-los como veículos para entregar ou retirar DNA (informação genética) das células de modo a que possam produzir novas proteínas ou que parem de produzir outras. Estes vetores podem depois ser usados em medicina para corrigir doenças genéticas, por exemplo.

Todo este conhecimento e infraestruturas colocou-nos numa posição em que facilmente conseguimos adaptar os nossos conhecimentos à deteção e estudo deste novo coronavírus. A nível prático, em primeiro lugar, disponibilizámos e adaptámos um dos nossos laboratórios à análise e deteção de SARS-CoV-2 em amostras clínicas, de modo a expandir a capacidade de testes do Sistema Nacional de Saúde Britânico, para além de termos destacado colegas para darem apoio nas análises laboratoriais nos três hospitais que fazem parte do KCL. Por outro lado, apesar de (e também por) termos parado a investigação relacionada com outros vírus, pudemos adaptar rapidamente os nossos reagentes e máquinas para iniciar estudos envolvendo proteínas de SARS-CoV-2 nos laboratórios de biossegurança de nível 2.

Para trabalhar com o vírus infecioso SARS-COV-2, preparámos documentação relativa à segurança e ética de trabalho com esse vírus, faltando apenas a aprovação final do governo Inglês para iniciarmos os trabalhos no nosso laboratório de biossegurança de nível 3. Todo o trabalho envolve um grande esforço de todos os colegas, pois temos de manter o distanciamento social e trabalhar com (ainda mais) proteção.

Uma coisa é certa: os cientistas estão a ter uma notoriedade particular durante esta pandemia. Ao contrário de certas áreas que vão ter grandes taxas de desemprego após este surto, acha que esta situação, por outro lado, vai reforçar o investimento na ciência?

Espero que sim! Tanto a nível governamental como de empresas. Esta pandemia vem apenas realçar a necessidade que temos de investir em I&D, não apenas em produção de fármacos, mas também na produção de conhecimento, tão necessário para facilitar a primeira. E claro que a pandemia realça a necessidade de investigação na área da biologia/ medicina. No entanto, muitas outras áreas também são necessárias... O conhecimento nunca é demais: uma coisa que parece irrelevante hoje, poderá ser utilizada com um fim inesperado amanhã, podendo mudar o curso da humanidade!

Muito obrigada!

Imagem de destaque cedida por Luís Apolónia

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Created By: Filipa Ribeiro da Fonseca
Published: 30-10-2020 16:57

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