Mariana Flor e Almeida Antunes Alves - C20
Técnica Industrial de Moçambique | Maputo
Moçambique
Ao
chegar a Maputo é quase imediato perceber que seremos apenas mais uma presença portuguesa no meio de tantos outros. Ao olhar em redor, por momentos quase nos sentimos em casa, quando constatamos que a arquitetura que nos rodeia é essencialmente Portuguesa.
Essa presença da arquitetura Portuguesa, não passa apenas pela arquitetura que conhecemos como portuguesa, mas também pelos seus intervenientes Portugueses.
Por isso quis saber um pouco mais e contextualizar-me na história da cidade. Esta, anteriormente chamada de Lourenço Marques foi fundada em 1782, numa altura em que todo o país estava no domínio dos Portugueses e assim permaneceu durante varias décadas até 1974. Desse modo é fácil compreender que o crescimento e desenvolvimento da cidade foi expandido por Portugueses, juntamente com outras nacionalidades. Por isso a presença da arquitetura Portuguesa é uma presença constante, em cada rua, em cada esquina.
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Figura 1 - Edifício da Estação de Caminhos de ferro, localizado na praça dos trabalhadores. |
A cidade de Maputo tem uma diversidade cultural vasta, que se reflete bastante nos edifícios. Isto vai desde a casa colonial simples aos edifícios mais complexos, comerciais, escolas, templos, entre outras, locais com que nos confortamos dia a dia sempre que saímos de casa.
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Figura 2 – Padaria Saipal em Maputo de 1954, localizado na Avenida Filipe Samuel Magaia, Edifício industrial, com uma plasticidade conceptual pouco usual. |
Por gostar tanto de arquitetura, nos passeios que fui dando pela cidade, fui -me confrontando com edifícios que tinham características diferentes. A curiosidade levou-me a procurar pelo seu autor, e foi nessa busca que percebi que este tinha falecido o ano passado. Por já conhecer algumas das suas obras em Portugal e por saber que é uma grande referência da arquitetura neste pais, decidi saber um pouco mais, homenagear o arquiteto e a arquitetura partilhando, esta bonita parte da cidade.
PANCHO GUEDES
Falar sobre o Pancho Guedes é recuar um pouco no tempo.
No inicio dos anos 50, surge uma presença notória na cidade de Maputo com nacionalidade Portuguesa, um arquitecto Português que dedicou grande parte da sua vida a este país e nomeadamente à cidade de Maputo, o arquiteto “Pancho” Guedes.
“O arquitecto Pancho Guedes morreu neste sábado, na África do Sul, acompanhado pela sua filha mais nova, Kitty. Tinha 90 anos. Nascera a 13 de Maio de 1925. A sua morte marca o fim de uma época. Sem Pancho, Portugal fica amputado de uma parte da sua cultura arquitectónica do século XX, precisamente a que é mais heterodoxa: desconcertante, propositadamente anti-racional, plástica e exuberante. O oposto da arquitetura portuguesa.” Ana Vaz Milheiro”
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Figura 3 – Edificio Mann George em Maputo de 1954, localizado na rua de Consiglieri Pedroso, Edificio da empresa Mocambicana de navegação – Sarl. |
Um arquiteto Português chamado Amâncio de Alpoim de Miranda Guedes, nasceu em 1925 em Lisboa e aos 7 anos mudou-se para Maputo. Pancho frequentou a escola primária em Moçambique e foi para a África do Sul, no tempo do liceu. Foi para a Universidade de Witwatersrand no final da Segunda Guerra. Foi pintor antes de ser arquiteto e essa característica é uma grande marca nas suas obras, a combinação entre o rigor formal e a exuberância na criatividade, associando artes como a pintura, escultura e arquitetura.
É perceptível que o crescimento da sua arquitetura muitas vezes é o reflexo das suas viagens à Europa e assim as suas obras são muitas delas baseada no formalismo do estilo internacional. Pancho Guedes reinterpreta-se na temática africana nas suas obras. Configurando-lhes qualidade e características diferenciadoras da arquitetura da época, criou um estilo próprio que auto denominou de Stiloguedes.
Figura 4 – Edificio Prometheus em Maputo de 1953, localizado na rua Julius Nyerere, Sommerschield, de habitação colectiva o autor fez uma interpretação dos estudos de Picasso.
Stiloguedes, que se caracteriza pelos “dentes” modelados no betão é um estilo que segundo se diz, representa o arquiteto no seu mundo mais fantasioso. São edifícios com picos e presas, com fachadas que são atravessadas por formas que são criadas pelo betão, que muitas vezes parecem meros ornamentos, mas que muitas vezes são pensados com características de sombreamento e de boa climatização.
Figura 5 – Edifício Khovolar em Maputo de 1966, localizado na av. Aniceto do Rosário, edifício de acomodação de rapazes e raparigas suíços.
Enquanto fui fazendo este percurso na procura das obras do Pancho Guedes percebi que existem 142 obras espalhadas pela cidade. (Encontrei um mapa da cidade que mostra onde se situam todas as suas obras). Não consegui visitar todas mas fui-me apercebendo que os planos dos edifícios Stiloguedes são funcionais e simples. Fui encontrando pessoas que viviam nas suas obras e apesar da degradação que se vê no exterior, todas as pessoas se sentem confortáveis nos espaços, gostam de habitar os espaços e quem conhece o seu arquiteto sente bastante orgulho em habitar as casas de Pancho Guedes.
Figura 6 – Edificio Tonelli em Maputo de 1954, localizado na Av. Patrice Lumumba e a Av Vladimir Lenine, habitação colectiva de 11 pisos.
O edifício que mais gostei, possivelmente por conhecer a sua história, foi o “Leão que ri”, consegui entrar e apreciar cada espaço. É incrível como o seu autor pensou em todos os pormenores, as cores dão bastante alegria, as formas geométricas não estão colocadas ao acaso e o facto deste ter construído esta obra para si mesmo vê que a obra é muito à sua imagem de arquiteto heterodoxo e que não deixa ninguém indiferente.
“Leão que Ri, Unidade de Habitação corbusiana de pequena escala (apenas com seis apartamentos), seria a obra prima deste período. Foi projectada para si. Em 2003, numa conferência da sua velha escola Witts, esclareceria: “O Leão tem agora 50 anos... Levou imenso tempo a pôr de pé, pois nós éramos também os clientes. O Leão era nosso, e de forma alguma faríamos compromissos.” ANA VAZ MILHEIRO