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Compreender as formas de Habitar dos Millenials

Ana Azevedo Cardoso & Clara Antunes | C22 | CC Atelier de Arquitectura & Ponte 9 – Plataforma Criativa | Macau, China

O presente artigo explora a forma de habitar dos Millennials no contexto urbano – dado que as cidades abrigam, hoje, mais de metade da população mundial – em Macau e Portugal. Apresenta ainda as nossas experiências enquanto jovens estagiárias INOV Contacto em Macau, e opiniões sobre o tema proposto.

“Confiam no seu sucesso profissional, acham que são bons cidadãos e acreditam num país com menos desigualdade... Não querem comprar casa, mas querem sair da beira dos pais.” in Público, Beatriz Silva Pinto, 4 de Junho de 2018

Entenda-se por Millennials os nascidos entre os anos 1980 e 2000, geração que representará 75% da força de trabalho em 2025. No que se refere ao conceito de Habitar, e fazendo uso das palavras de Heidegger: só podermos habitar os lugares onde a vida acontece. Habitar não reside no facto de se possuir uma residência, mas traduz-se no modo como o indivíduo, ao relacionar-se com as suas potencialidades de ser-no-mundo, constrói e molda o espaço que o circunda. E construir, quando pensado a partir do latim colere, significa cultivar.

Estabelecer uma ponte entre os conceitos acima referidos e a realidade económica revela-se crucial para entender de que forma os modos de habitar são por esta condicionados. Assim, apresentam-se valores estatísticos lançados pela DSEC (MO) e pela Pordata (PT):

- Macau: no 1º trimestre de 2017, o índice global de preços da habitação cresceu 4,7% e, verifica-se que os gastos com esta, representam 66,5% das despesas gerais das famílias.

- Portugal: em 2015, o rendimento médio das famílias somava 29.578€/ano, representando o consumo dos valores acima, 78% das despesas.

Dados do 1º trimestre de 2017 referentes aos Millennials portugueses (segundo a Multidados e CH Business) revelam que, tendo em conta a taxa do desemprego jovem - no final desse ano situada nos 24,2%, de acordo com dados do INE -, somente 60% dos inquiridos se considera financeiramente independente, e apenas 41% planeia comprar casa nos próximos 5 anos. No entanto, 73% dos jovens afirma que, findo este período, não pretende co-habitar com os familiares.

Torna-se, assim, claro o peso da habitação no quadro das despesas globais, motivo pelo qual a maioria dos jovens que habita em contexto urbano, onde as rendas são inflaccionadas, opta pelo arrendamento e co-partilha do espaço de habitação.

AC: “O processo de procura de apartamento começou ainda em Portugal, após o anúncio oficial do meu destino. Pesquisas individuais contribuíram para a construção de uma ideia de mercado, mas a compreensão da realidade concluiu-se no contacto físico com o espaço da cidade. Foram quase 2 semanas de busca intensiva. Cumpre salientar que recorri a um agente imobiliário que, ainda hoje, desempenha um papel crucial de intermediário, desmistificando e derrubando a barreira da língua. Foram várias as condições/preferências que pesaram na minha decisão de aluguer:

- preço - verifica-se uma intensa especulação imobiliária e aumento do custo de vida em Macau;

- localização - proximidade do trabalho e acesso a serviços de transporte;

- condições e conforto do apartamento e dos quartos;

- existência de uma comunidade prévia de partilha - o processo foi facilitado pelo facto de conformarmos um grupo de 21 estagiários que partilham a língua e experimentam um regime comum de adaptação à cidade, com tempos idênticos e um ímpeto coletivo de organização mediante interesses comuns;

- efemeridade - a consciência do tempo de permanência, limitado a 6 meses, em paralelo com a minha flexibilidade influenciaram a decisão final, traduzindo-se na abertura a um maior leque de possibilidades.

Olhando no presente, para o cenário do mercado da habitação e para a própria dinâmica do sistema social, e tendo em consideração a evolução tecnológica e a facilidade de mobilidade, dúvidas não me restam que o modelo e o próprio entender do habitar transformar-se-á, sendo que:

- o que as pessoas procuram numa habitação vai evoluir, atendendo a outras necessidades;

- o processo de aquisição será acelerado pelo recurso a tecnologias de bases de dados globais, que permitem uma filtragem eficaz da pesquisa, adaptável ao pretendido, atenuam o impacto da burocracia de contratação, eliminam entraves linguísticos e oferecem formas de pagamento facilitadas;

- o fenómeno da impessoalidade acentuar-se-á, na medida em que a comunicação entre interlocutores será agilizada;

- o futuro transcende qualquer carácter versátil que possa ser atribuído à habitação enquanto unidade física, e incidirá, sobretudo, numa qualidade móvel.”

CA: “A minha experiência de habitação em Macau é um reflexo da atual comunidade global. Partilho apartamento com a Roxana, uma romena aqui estabelecida há 6 anos, no condomínio One Oasis.

Com serviços como um Health Club, Shuttle ou Concierge 24/7, os edifícios de 48 pisos conformam um enclave de expats, alheado do denso contexto chinês. Tudo é perfume, cuidado esmerado, mármore polido. Curiosamente, os residentes são sobretudo trabalhadores de classe média. Aperceber-me da aparente democratização do luxo no acesso à habitação em Macau revela-se tão surpreendente como chocante: há um gap notório entre os trabalhadores intelectuais e os não qualificados (migrantes das Filipinas ou da China Continental), os quais auferem salários no limiar da dignidade. Por outro lado, a economia de Macau atinge o break-even em abril, sustentada nas indústrias do Jogo e do Turismo.

Os demais setores da sociedade são mero ornamento. A cidade funda-se no visível, a essência feita fumo pelo barulho das luzes. É esta contra-essência aversa à ideia de Habitar e, talvez por isso, ninguém pareça desejar estabelecer-se na cidade. Os Millennials que aqui fazem a sua vida não são exceção: em Macau, tudo é transitório.

Regressando a Heidegger e à ideação de casa, refere-se o autor a Habitat como a morada do fogo interno. Habitar sendo, como tal, o ato de se deixar receber por essa experiência essencial de nós. Não surpreende, assim, que as formas de Habitar sejam múltiplas, à medida da imensa panóplia de existências.

Há nos Millennials uma valoração absoluta da liberdade, força base da possibilidade de gerar impacto, sem contingências circunstanciais. E dessa obsessão vivencial, derivam formatos de habitar menos ortodoxos: caravanas que se sediam onde entender a vontade; comunidades que partilham espaço, meios e ideologias próprias; modos de viver próximos da natureza, num manifesto contra a sociedade de consumo; relações poliamorosas que compartem quartos sem hierarquia; prédios devolutos ocupados por gentes anónimas, lar sendo onde mora um colchão. Um quadro complexo, com um denominador comum central: a criação de condições para o repouso anímico. E esta pulsão precípua é premissa base do Habitar, desde sempre, para sempre.

Há, porém, a assinalar, nas sociedades ocidentais, uma mudança de ordem (a)moral: os Millenials transformam em definitivo o modelo único de habitar – em unidades familiares, em espaço próprio ou sob regime de aluguer –, instaurando uma apreciação positiva, não condenável, da diversidade de possibilidades. Queremos acreditar, nesta ode à impermanência e hiper-valorização da cumulação de experiências que dita o paradigma da mobilidade global, “no strings attached”. Será?

Millennials, a geração que se alimenta de raízes voadoras, na ilusão da liberdade, mas sonha com pastéis de nata e uma casa à beira-mar plantada.”

Entrevistámos 5 Millenials residentes em Macau sobre a sua experiência de habitação.

Propomos uma escuta atentaAQUI.

Completamos o artigo com imagens e impressões dos nossos colegas INOV Contacto sobre as suas moradas temporárias em Macau.

Created By: Clara Raquel Mealha Antunes
Published: 12-12-2018 14:53

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